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quinta-feira, 1 de setembro de 2011

DOUTRINA DE EMPREGO DA FORÇA DE CHOQUE

Autor: Elvis de Jesus
Inspetor da Guarda Municipal de São José dos Campos SP

Blog Miliciano Municipal
email: gcmelvis@hotmail.com
As FORÇAS DE CHOQUE devem balizar sua técnica em meios de instrução disponíveis e disponibilizados pela Corporação, em que serão registradas e recomendadas as táticas e os meios utilizados para o cumprimento da missão, bem como para delinear os limites da atuação do efetivo frente à perturbação da ordem.


As Ordens de Serviço e as recomendações do comando são de suma importância para execução da missão e a atuação da Força de Choque, pois a lei apenas determina a competência das Guardas Civis Municipais, não faz previsão para atuação em casos específicos, então toda operação deve ser necessariamente precedida de planejamento, instrução e recomendação.


Rememoremos o fato acontecido na cidade de São Paulo, conhecido como a “Invasão do Carandiru”, em 1992 onde morreram 111 presos durante a invasão da Força de Choque e demais unidades envolvidas.


Podemos constatar por meio dos Embargos Infringentes no acórdão prolatado pela 8ª C. do Tribunal de Justiça de São Paulo, na Apelação n. 240.511.1.7-00-n. 240.511-1/9-01 - São Paulo, a seguinte decisão:


“A morte de qualquer deles, nas circunstâncias, foi manifestamente excessiva, como resultante da repressão policial. Sabe-se, porque a mídia informou que as unidades da Polícia Militar que teriam participado da operação foram: o Comando de Operações Especiais, a Força de Choque, o Grupamento de Ações Táticas Especiais e a Rota. À exceção da Força de Choque, especializada em reprimir motins, como se sabe, as demais ostentam nítido caráter puramente repressivo. Vale dizer que, no caso, o Estado empregou tropas inadequadas para controlar a situação, o que fortalece, ainda mais, a tese do excesso para justificar a obrigação de reparar”.      


 Dentro dessa premissa, importante será o ADESTRAMENTO e o CONHECIMENTO do efetivo sobre as técnicas e as táticas operacionais aplicadas ao controle de distúrbios civis, bem como o conhecimento apurado do equipamento e armamento usados nas operações.


Portanto, todo componente da Força de Choque deverá estar ciente da sua missão e conduta no cenário de operações, visando o cumprimento da missão em consonância com os limites da ação de restauração da ordem pública.


 Uso do armamento e equipamento da Força de Choque: princípios a serem observados para o enfrentamento de uma crise em uma área urbana ou rural, a Força de Choque deverá dispor dos seus meios logísticos para fazer frente a uma situação em que o uso da força legal será necessário.


Dessa forma, os Guardas Civis Municipais deverão usar a força legal nos limites exigidos para a restauração da ordem pública.


Durante um congresso realizado em Cuba (1990), foram adotados princípios básicos sobre o uso da força e das armas de fogo pelos ENCARREGADOS DA APLICAÇÃO DA LEI, em que o emprego das armas não-letais foi considerado um meio eficaz para limitar o uso inadequado de armas de fogo, a fim de evitar ferimentos ou morte às pessoas.


Assim, por exemplo, o policial designado como atirador do pelotão – portando a espingarda Calibre 12 com munição de borracha – não poderá agir isoladamente, mas sempre por meio de ações delimitadas e DEVIDAMENTE COMANDADAS.


Como é a práxis, a Força de Choque é indivisível a ação se dá em CONJUNTO, nunca de forma ISOLADA e, sendo assim, nenhum componente poderá atuar isoladamente, sob pena de ser responsabilizado diretamente por seus atos.


Cada Guarda Civil Municipal integrante da Força de Choque também age sob comando, não devendo exceder os limites impostos para a restauração da Ordem Pública. Desta forma, os milicianos deverão estar atentos aos comandos determinados pelo comandante da operação, a fim de não cometerem desvarios e arbitrariedades, bem como desencadear ações que não são tempestivas para a resolução da crise apresentada naquele momento.


As funções exercidas por cada Guarda Civil Municipal da força  de choque devem estar bem claras e limitadas pelas orientações e recomendações, ainda que verbais, com o objetivo de delimitar as ações de cada um, para que estas ações estejam nos estritos limites da legalidade e da legitimidade.


Assim, o Guarda Civil Municipal na função de escudeiro tem a sua razão de ser, bem como o Guarda Civil Municipal encarregado de efetuar o lançamento de granadas.


Portanto, seja o escudeiro, seja o granadeiro ou o encarregado de fazer prisões, agem sob comando do responsável pela Força de Choque ou pela operação.


É inadmissível que o Guarda Civil Municipal aja isoladamente, pois estaria violando um princípio primordial da doutrina de choque, que é a indivisibilidade.


O Miliciano Municipal age apenas e somente sob ordens, e não ao seu alvedrio ou de acordo com suas próprias conveniências pessoais.

Portanto seja no emprego da força ou dos meios de contenção, a ação será sempre precedida de COMANDO, Força de Choque é DISCIPLINA e DOUTRINA, não são Guardas Civis Municipais enfeitados ou com cara de mau, são profissionais selecionados dentre os melhores para compor um seleto grupo de pessoas encarregadas de fazer a restauração da ordem ou impedir o rompimento desta.


Episódio ocorrido em determinado bairro da Região Sul de São José dos Campos, deixou um grande lição a ser sempre pensada pela Corporação, o planejamento, a disponibilidade de equipamentos, a inteligência orgânica, a quantidade de efetivo, o terreno, o bloqueio das vias de acesso, a identificação das pessoas e a motivação dos manifestantes deveriam ser objetos de acurados estudos a fim de garantir o sucesso da operação.


Todo componente da Força de Choque deve ter consigo o equipamento de proteção individual e coletivo, (escudo, cassetete, espargidor, caneleiras, capacete, etc.), porém, apenas os Guardas Civis Municipais incumbidos da função de comando, poderão estar armados com armas de uso individual (revólver ou pistola), caso haja avaliação positiva para essa medida.


O objetivo de centrar esse armamento apenas em funções de comando é para evitar que ações coletivas, no uso do armamento, sejam desencadeadas de modo indiscriminado. Assim, durante um provável confronto entre manifestantes e a força legal, o uso do armamento ficaria limitado aos policiais naquela função, bem como aos policiais incumbidos da segurança da Força de Choque.


Fatos como os ocorridos no episódio citado não podem acontecer durante uma operação, e podem ser evitados com o treinamento e instrução pormenorizada à Força de Choque.


Assim, os Guardas Civis Municipais incumbidos da segurança da Força de Choque, e que poderão estar armados com munição real para pronta resposta à agressão armada, deverão ser instruídos constantemente, para que ajam apenas com o intuito de neutralizar a ação do manifestante ou do grupo armado, que esteja colocando em risco a vida de civis e dos componentes da Força de Choque, esses profissionais devem ser escolhidos dentro do quadro dos mais disciplinados dos disciplinados, pois poderá decidir pela integridade ou lesão de pessoas.


Nesse prisma, também os Guardas Civis Municipais responsáveis pelo lançamento de munição química deverão estar atentos às ordens e instruções referentes ao uso dessa munição, para que não haja o uso indiscriminado e descontrolado das granadas disponíveis durante a operação.


Assim, o uso da munição química fica restrito ao caso apresentado no cenário de operações. As limitações deverão ser repassadas aos Guardas Civis Municipais, com o objetivo de evitar excessos e desperdícios no uso de um meio eficaz no controle de distúrbios civis.


As granadas utilizadas devem ser as especificas para o tipo de intervenção que a Força de Choque estará empenhada.


O encarregado de lançar granadas deve saber qual é a granada que fará o efeito desejado no grupo de manifestantes desordeiros.


Não obstante isso, o Guarda Civil Municipal somente fará o lançamento de munições químicas ou granadas quando determinado pelo Comandante da Operação, e não quando o GCM pensar ser a “HORA CERTA”, tal princípio tem o objetivo de centralizar as ações da Força de Choque, a fim de que se evitem excessos e arbitrariedades.


O granadeiro deverá observar, durante o uso dos artefatos, a proporção entre as granadas lacrimogêneas e as de efeito moral, sob pena de esgotar o arsenal disponível para operação. Assim, caberá a este Guarda Civil Municipal balancear o uso da munição química de acordo com o tipo de situação enfrentada pela Força de Choque.


Outro aspecto importante é o Guarda Civil Municipal responsável pelo uso da munição de impacto controlado - munição de borracha. Esta munição, como muitos a chamam de “não-letal”, pode em muitos casos ser MAIS LETAL que a própria munição real.


As especificações do fabricante devem ser observadas para que o seu uso seja profícuo.


A distância mínima para o seu uso, em se tratando da munição para Calibre 12, é de 20 metros, sendo a visada feita na região dos membros inferiores.


Não podemos olvidar que os confrontos entre manifestantes e a Força de Choque, podem acontecer a menos de 20 metros. Portanto, o policial equipado com a espingarda Calibre 12, depois de recebida à ordem para efetuar os disparos, seja em comando único ou em comando “para carga”, deve avaliar o grau de letalidade que a munição possa oferecer aos manifestantes.


Essa avaliação tem por objetivo evitar que pessoas se firam gravemente e vidas venham a ser ceifada.


Apesar de enfrentar uma manifestação violenta, o Guarda Civil Municipal não poderá alegar legítima defesa ou o estrito cumprimento do dever legal se usar a munição de impacto controlado ou munição de festim de modo indiscriminado.


Porém se o Guarda Civil Municipal, estando equipada com esse tipo de munição, causa à morte de um manifestante armado que, atenta contra a segurança da Força de Choque, o caso será diferente.


Assim, deve o Guarda Civil Municipal observar a distância de segurança entre a Força de Choque e os manifestantes para efetuar os disparos com firmeza e certeza, a fim de que o objetivo primordial seja alcançado.


Caso o Guarda Civil Municipal se depare com um confronto a menos de 20 metros da Força de Choque, deverá efetuar os disparos na região dos membros inferiores, e nunca em direção à cabeça ou tórax.


O uso indiscriminado e fora das especificações referentes à munição poderá gerar responsabilidades diretas para o Guarda Civil Municipal e para o Estado.


Destarte, as instruções e o treinamento da Força de Choque são essenciais para o adestramento e o aprimoramento dos Guardas Civis Municipais envolvidos nas diversas situações, em que a Força de Choque venha a enfrentar no seu cotidiano.


CONCLUSÕES


Todas as ações da Força de Choque devem estar pautadas pela LEGALIDADE e OPERACIONALIDADE, em cumprimento aos ditames da lei e as Ordens de Serviço e recomendações do Comando da Corporação.


A finalidade primordial da INSTRUÇÃO DA FORÇA DE CHOQUE é para que esta possa conhecer a sua competência legal, bem como conhecer os limites da ação de manutenção ou restauração da ordem pública.


Possuir o conhecimento das técnicas e das especificações do equipamento operacional usado pela Força de Choque é uma obrigação a todo GCM que passe pelo Curso de Técnicas de Controle Urbano, pois sem o devido conhecimento técnico e legal das ações rotineiras desempenhadas por essa Força, estaremos fadados ao fracasso e a inúmeros processos por abusos ou ilegalidades.


Caso haja abusos ou excessos, estes deverão ser rechaçados por meio da devida apuração, na busca da autoria e materialidade, a fim de subsidiar a ação penal contra os agentes públicos que excederam no exercício de suas atribuições, a falta de energia, a covardia o desinteresse, a falta de planejamento, de orientação e providências logísticas para a operação também deve ser objeto de apuração.


Vale ainda ao encerramento desse tópico ressaltar o que prescreve o art 37, §6º da Constituição Federal:


“As pessoas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.


Por derradeiro, cabe salientar que o aprimoramento leva a perfeição.


A busca por uma qualidade do serviço deve ser sempre a nossa meta. Disso depende a nossa sobrevivência no serviço operacional, bem como a de nossos companheiros que estão diuturnamente ao nosso lado.


Unidos neste mesmo pensamento estaremos afastando o INSUSSESO, a PREGUIÇA, o FRACASSO, a INDISCIPLINA e, acima de tudo, preservando as nossas vidas e garantindo a ordem e a paz social que deve reinar em nossa cidade.


Quanto maior o grau de adestramento da Força de Choque, maior será a possibilidade de sucesso da operação, muitas das vezes sem ter até mesmo que utilizar a força que demonstra ter e condições de empregá-la.


Todo aparato (EQUIPAMENTOS, ARMAS NÃO LETAIS, MUNIÇÕES NÃO LETAIS, DISCIPLINA COMPORTAMENTAL), demonstrados visa dissuadir a intenção de desordem por parte dos manifestantes, quanto mais “FORÇA, DISCIPLINA e EQUIPAMENTOS” forem demonstrados maior será o grau de dissuasão, essa é a prática e a doutrina chamada de CHOQUE PREVENTIVO, sempre que houver uma possibilidade de enfrentamento, haverá também uma avaliação por parte do manifestante quanto ao sucesso da perturbação e possibilidade de encarceramento, isso faz com que haja a necessária reflexão e a possibilidade de dissuasão, dando ao evento um fim pacifico e aceitável pela sociedade.

Um comentário:

  1. Bem interessante como a palavra "limite" foi usada no texto ao falar do que eu diria ser a situação mais frágil que se pode acontecer em uma sociedade que almeja a democracia plena, aquela que fica entre o distúrbio e a repressão a manifestações legítimas. Sabemos que o Brasil "cresceu" no último século gerenciado por um tipo de Estado chamado por alguns de "burocrático-autoritário" em que tem como ferramenta de crescimento a repressão política, que pode ser expressa pela repressão policial. Então acho válido que, como disse o autor, o uso da força em tais casos não seja marcada pelos "Guardas Civis Municipais [ou quaisquer agentes policiais] enfeitados ou com cara de mau" cujas ações são arbitrárias e truculentas.
    Temos que lembrar também que o cidadão brasileiro tem razões de sobra para o efetuar manifestações e até quebra da ordem e do silêncio, então as forças do Estado tem que lembrar que nesses casos, mais do que qualquer outro, definitivamente não estão lidando com bandidos ou com terroristas, mas sim, na maior parte dos casos, com cidadãos de bem, e digo mais, exemplos de pessoas em nossa sociedade, pois são pessoas que se propõe a manifestar os direitos do coletivo ou o seu direito de discutir, mesmo que isso custe reservar um tempo do seu cotidiano a não estar ganhando dinheiro, o que parece um absurdo em nosso país.
    Sendo assim, os brasileiros estão voltando a se mobilizar nos últimos anos, e nós temos esse direito o de fazer barulho e de fechar ruas então é interessante que o Estado repense um pouco o uso de forças de represão e também repensar meios de punir arbitrariedades(o que sabemso que não ocorre na prática, lembramos do fato da tropa de choque de SP ter a identificação dos policiais escrita em cores de difícil visualização, o que impede uma investigação de qualidade). E fora isso, também temos de lembrar que a força do Estado não pode exceder não só os limites da legalidade, mas também os limites do respeito a população.

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