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sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

A Certeza e a Segurança da Incolumidade Pública



Autor: Carlos Paiva
Inspetor aposentado da GCM/SP
Foi Instrutor de Ética, Normas de conduta Profissional; Técnicas Operacionais e Noções de Gerenciamento de Crise.


Há alguns dias escrevi um texto sobre os ataques criminosos contra policiais e acredito que ficou faltando algo; apresentei um problema, mas não apresentei soluções, que felizmente existem e na minha vida profissional jamais levei um problema a um superior sem ao menos uma resposta possível de ser aplicada; por isso decidi escrever sobre as possíveis soluções para o caso PCC, no entanto, ao começar a trabalhar o texto, percebi que faltaria outro texto que ligasse os dois, o que resultou no presente artigo, que não chega a ser uma segunda parte, é mais uma digressão que mostra uma face do que está acontecendo e que não está presente nos dois textos, mas serve de elo entre eles. Explicado isto, começo o desenvolvimento do assunto expressado no título.

Lembro uma vez de ler em um artigo sobre a Certeza e a Segurança Jurídica; em resumo, um cidadão brasileiro diante uma fato que o atingiu e que vai ser resolvido pela Justiça, tem a certeza que a Lei não vai mudar justamente para o caso dele, como também tem a segurança que a decisão da Justiça não será alterada para prejudicar aquilo que foi julgado a não ser, o que também é garantido por lei, que beneficie a pessoa. Creio que os juristas fiquem horrorizados com esta minha explicação simples sobre duas coisas sagradas no Direito, mas realmente eu preciso apenas desta muito simples explicação para fazer uma analogia com o que está acontecendo na cidade de
São Paulo.

Em qualquer país civilizado, o cidadão comum vive sob a certeza que o Estado está vinte e quatro horas e sete dias da semana trabalhando para garantir a segurança da população e no caso de um crime, trabalhando para a responsabilização do culpado que assim declarado em um processo legal, que permita ampla defesa e um tribunal imparcial, recebe a justa pena, seja uma multa seja a restrição de liberdade ou as duas medidas, cuidando para que fique afastado da sociedade, à qual ofendeu, pelo tempo que a lei determinar.

Esta certeza gera uma segurança no cidadão comum: a de que a sua vida e a de seus familiares, bem como seus bens estão sob uma segurança tal, que não é necessário que o cidadão comum tenha que se armar ou organizar grupos para se defenderem de ataques; a segurança também lhe garante que sua vida será rotineiramente protegida, isto é, o seu acesso à saúde, transporte, trabalho, estudo e lazer não sofrerá mudanças drásticas de hora em hora ou de dia em dia e isto permite que possa planejar sua vida sem maiores preocupações; seu filho estará seguro na escola assim também a esposa esteja ela em casa, no trabalho ou simplesmente no mercado.

Este estado de paz e tranqüilidade é o que chamo de Certeza e Segurança da Incolumidade Pública. É a confiança que o Estado está cuidando de você e é capaz de manter isto indefinidamente.

Sem dúvida, tanto a Certeza quanto a Segurança da Incolumidade permite que uma sociedade viva e se desenvolva em relativa paz. Na pacífica Oslo, Noruega, houve um ataque praticado por um homem que matou cerca de 92 pessoas em um massacre de motivação política; ora, as pessoas naquele país não viviam e não vivem como se tal ataque fosse acontecer a cada período determinado, foi algo de extraordinário, destas coisas que são um pesadelo para um governo e para a polícia local. Hoje em dia deve
haver lembranças e traumas, mas acredito que depois de tudo, os cidadãos continuem vivendo na confiança de estar em uma sociedade segura, que conta com um sistema policial confiável e com um poder judiciário capaz de tomar decisões a favor da sociedade.

A Segurança e a Ordem Pública é um dever do Estado, como preconiza a Constituição Federal (CF/88), bem como é uma responsabilidade de todos. Contudo, dentro de um Estado, tem funções exercidas por pessoas concursadas que são exclusivamente relacionadas com a área da Segurança Pública, definidas em áreas de atuação. O médico e o gari, no exercício de suas funções públicas, não tem como objetivo o combate ao crime, ao contrário, o médico tem o dever de atender um criminoso baleado em um
confronto com a polícia e o gari tem que manter limpa a rua onde mora um traficante ou outro tipo de criminoso; mas caso eles venham a saber do criminoso, devem informar as autoridades policiais ou seus agentes, podem até prender em flagrante delito, mas não é um dever deles, são pagos, respectivamente, para examinar as pessoas e manter as ruas de São Paulo limpas.

Para o combate ao crime o Brasil conta com um intricado sistema de serviço policial e um sistema judiciário que trabalha com um processo antigo.

Pois bem, é este serviço policial junto com o poder judiciário, os responsáveis por manter a “... ordem pública, a incolumidade das pessoas e do patrimônio”, conforme a CF/88 em seu artigo 144. Apesar de eu mencionar o Poder Judiciário como co-responsável pela Segurança Pública, ele é tratado em outra parte da CF/88, distinta da Segurança Pública. A Justiça no Brasil trata dos assuntos comerciais, civis e criminais, entre outros, e é por este laço, de julgar criminosos, que a associo com a Segurança Pública. O Poder Judiciário geralmente é criticado pelo fato do preso sair facilmente da prisão ou então de nem chegar a ela, mas isto é uma visão errada, o Judiciário segue a lei e a lei não é elaborada por esse Poder, é elaborada pelo Legislativo, formado por
pessoas eleitas pelo povo, para criar leis entre outros deveres; desta maneira, o Judiciário toma decisões com base nas leis existentes; o que acontece neste poder é a possível existência de corrupção, sentenças mais brandas e a criação de jurisprudência, aí sim, um tipo de lei que pode facilitar a vida de um criminoso.

Antes mesmo dos assassinatos dos policiais, a cidade de São Paulo já demonstrava fraqueza na sensação de segurança, tanto que um motorista, conforme a região que está na cidade e isto não exclui a região central, no período próximo entre meia noite e próximo às quatro horas da manhã, prefere tomar uma multa por infringir um sinal vermelho a ficar com o carro parado esperando o sinal verde; nem é necessário esperar meia noite, basta estar escuro para que haja o medo, mas não é só isto; tem áreas na cidade que o cidadão evita passar seja qual for a hora do dia; outro exemplo é a crença
comum e de certa forma real, que adolescentes infratores, um eufemismo legal para criminosos, contam com um sistema que simplesmente não deixa que eles fiquem muito tempo internados, outro eufemismo legal que é usado para prisão. Tem um caso registrado no Youtube onde um delegado expressa sua revolta pela apreensão de menores infratores que foram liberados em um curto intervalo de tempo, este vídeo gerou até uma resposta da juíza responsável explicando a dificuldade de se apreender um menor infrator (os links para estes vídeos estão no final do texto, mas não temos garantia de que não sejam retirados da internet) um grupo de adolescentes e mesmo de crianças, hoje em dia, deixa uma pessoa comum desconfortável, dependendo do local, hora e circunstância; adolescentes e crianças não deveriam, em uma sociedade sadia,
provocar medo seja qual fosse o local, a hora e a circunstância.

Desgraçadamente, o assassinato de policiais foi acompanhado por um incremento na violência paulistana com a ocorrência de várias chacinas, alguns ônibus queimados e decretos de toque de recolher em algumas zonas da cidade e embora o PCC seja dado como elo comum entre estas ocorrências, não existem provas concretas de sua responsabilidade. Por enquanto, a população não está sendo diretamente atacada, mas está diretamente atingido quanto à certeza e à segurança que o Estado possa realmente protegê-la e isto é tão pernicioso quanto um ataque direto.

Diante tal situação, o povo paulistano vê estremecer a Certeza e a Segurança de sua incolumidade. A sociedade encontra dúvidas palpáveis que o Estado possa controlar a criminalidade e oferecer Segurança de estar protegido em qualquer atividade que procure estar; o que está ocorrendo é que se o cidadão está estudando, é obrigado a sair mais cedo das aulas devido a um “toque de recolher”; se está perto de um policial, estando este à paisana ou uniformizado, sente que pode ser vítima de uma bala perdida ou entrar nas estatísticas como uma baixa colateral, se está na rua com amigos em uma noite quente, teme ser vítima de uma chacina, por isto, antes mesmo de acabar com o PCC, o Governo deve restaurar a confiança do cidadão, pois o fim do PCC é apenas um dos fatores que estão desestabilizando a eficácia e a eficiência do Governo no trato da Segurança e Ordem Pública.

Caso esta situação se prolongue, haverá um período de rendimento gordo para os donos de empresa de segurança, mas a parte da população que não pode arcar com um sistema de segurança privada, em um primeiro momento, evitará sair nas ruas em determinados horários e para determinados locais, mas é impossível que este recolhimento forçado perdure, as pessoas tem que viver, o que poderá levar a um processo armamentista, legal e ilegal, bem como formação de milícias de bairro, caso a situação venha a piorar.

Quando o governo falha em uma prestação de um serviço, a população ou a parte dela que tem recursos, trata de substituir o serviço público pelo privado.

Tem sido assim com a Saúde e com a Educação e, infelizmente, será assim com a Segurança se as coisas continuarem como estão.

Minha intenção não é ser alarmista e nem querer espalhar o medo; a polícia de São Paulo é considerada uma das melhores do mundo e é capaz de realizar a parte que lhe cabe, mas não sozinha, não em uma missão solitária.

No momento é importante que o cidadão recupere a confiança de poder estar em qualquer lugar e sentir-se seguro em estar ali, bem como acreditar que sua família, onde quer que esteja, também se encontre sob as asas protetoras do Estado.

Nesta situação, o PCC é apenas um item, perigoso é claro, que vem aumentar a incerteza e a insegurança do cidadão quanto à capacidade do Estado em cumprir com o seu dever de manter a segurança e ordem pública

Vídeo1: Delegado revoltado: 


Vídeo2: Juíza responde à declaração de delegado: 


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