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sexta-feira, 7 de março de 2014

Vox Legem – Contagem de Prazo no Direito Administrativo


A aplicabilidade do direito administrativo disciplinar sempre foi controversa, pois administração pública exerceu por décadas seu poder de império fundamentando suas decisões na verdade sabida, in dubio pro societate e polarizando as partes como réus, mas com a Constituição Federal de 1988, ocorreu uma mudança radical que permitiu os servidores públicos utilizarem de mecanismos como o devido processo legal, ampla defesa, o contraditório e a defesa técnica, mesmo assim ainda nos deparamos com decisões controversas que são diariamente combatidas no judiciário, muitas vezes pela inobservância dos princípios gerais do direito.

Algumas discussões que nos parecem superadas são de difícil compreensão para o gestor e até de alguns aplicadores do direito, que muitas vezes não concordam com a norma positivada, doutrinas e decisões dos tribunais.

A contagem de prazo é uma delas, porém se aplicada de forma equivocada terá consequências nefastas tanto para o servidor quanto para administração pública, que poderá deixar de exercer seu poder disciplinar caso incida a prescrição ou a decadência.

O direito permite algumas variações na classificação dos prazos processuais conforme o segmento da doutrina, porém a regra geral é a contida no artigo 184 do Código de Processo Civil, que nos permite adequar as nuances do direito administrativo.

Prazo é um lapso temporal para prática de determinado ato processual, sendo observada a época em que deveria ser praticado e executado, de forma inicial e final, para que sua validade seja efetivada.

Os prazos são classificados

1 – Legais, judiciais ou convencionais

Legais são aqueles previstos na lei, os judiciais aqueles que são fixados pelo magistrado por critérios objetivos, e os convencionais são aqueles estabelecidos de comum acordo entre as partes.

2 – Dilatórios ou peremptórios

Dilatórios são aqueles que previstos em lei podem ser ampliados ou reduzidos desde que realizados antes do vencimento do prazo, no caso o magistrado tem a prerrogativa de ampliação, porém a redução ou renúncia somente pode ocorrer por convenção das partes que também podem solicitar sua prorrogação desde que deferidos pelo magistrado, o que não ocorre nos peremptórios que são considerados fatais e improrrogáveis, portanto não podem ser objeto de convenção.

3 – Próprios ou impróprios

São aqueles fixados para as partes e acarretam a preclusão, os impróprios são aqueles exercidos pela justiça (juiz e auxiliares) e não comportam a preclusão, porém podem gerar sanções administrativas após apuração de eventuais responsabilidades.

4 – Comuns e particulares

Comuns são aqueles afetos a todas as partes e são realizados concomitantemente, os particulares atinge somente uma das partes.

As consequências dos prazos podem incidir no reconhecimento da prescrição, preclusão ou decadência, que são institutos processuais que possuem peculiaridades específicas. A preclusão é a perda da faculdade de praticar determinado ato processual, enquanto a prescrição é a perda do exercício da pretensão, porém pode ser suspensa ou interrompida em casos expressos em lei, afetando o curso da ação, já a decadência é a perda do direito de ação, não podendo ser suspenso ou interrompido.  

A regra geral é de que os prazos sejam contínuos, tendo como termo inicial a exclusão do dia do começo e termo final a inclusão do dia do vencimento, ou seja, a contagem de prazo se inicia no dia seguinte, desde que este seja dia útil, o mesmo se aplica para o dia do vencimento.

O grande desafio do direito administrativo é criar normas de fácil compreensão, pois em sua maioria os gestores públicos não possuem formação jurídica, porém são extremamente criativos, inovando teses e interpretações pessoais sem fundamento, que muitas vezes são avalizadas pelos operadores do direito em razão da vontade política e consequentemente pela subordinação hierárquica,  que traz inúmeros contratempos a todos os envolvidos.

Em se tratando de direito administrativo disciplinar a maioria dos atos são publicados em diário oficial, no caso do Governo e Prefeitura de São Paulo não temos publicações somente aos domingos e segundas-feiras, mesmo em se tratando de feriados e pontos facultativos poderemos ter publicações nos demais dias, mas há atos que são realizados a partir da ciência do servidor, que somente poderiam ser praticados em dia útil, mas na prática isso é muito diferente, pois há uma confusão o fato de certos segmentos não poderem ter descontinuidade, como saúde e segurança, não quer dizer que atos processuais possam ser praticados aos sábados, domingos e feriados, pois não há serviço de cartório ou administrativo para prática de determinado  ato, como apresentação de defesa ou recurso, que pode até ser protocolada nos serviços de plantão, porém seu termo final será computado tão somente no primeiro dia útil.

Eis que surge o famigerado dia útil, embora absurdo, alguns parcos gestores defendem domingo como tal, mas nem vamos abordar essa discussão por ser superada em qualquer segmento, porém a problemática está no cômputo do sábado, pois alguns atos ”externos”  são permitidos e convalidados neste dia, como citações, intimações e penhoras, lembrando que estamos nos atendo a prazo judicial, que mesmo praticado aos sábados somente terá início no próximo dia útil, essa sistemática foi prevista na legislação disciplinar da Prefeitura do Município de São Paulo, de forma expressa no § 2º do artigo 21 do Decreto nº 43.233/2003. 

Outra problemática, é o encerramento do expediente de forma antecipada, neste caso o prazo final será no próximo dia útil, comumente nas vésperas de natal e final de ano, temos o expediente encerrado geralmente ao meio dia, neste caso o prazo final ocorrerá no próximo dia útil. O mesmo não se aplica para a quarta feira de cinzas em que o expediente se inicia após o meio dia, sendo considerado dia útil, tanto para termo inicial como termo final.

A contagem de prazo, embora seja uma regra simples, na prática é objeto de inúmeras discussões e decisões controversas, com defensores de início de termino de prazo aos sábados, domingos e feriados para a prática de atos processuais, portanto buscamos criar a seguinte tabela.



Nos exemplos, buscamos demonstrar o início e término do prazo de 03 (três) dias para prática de determinado ato processual:

1 - No primeiro quadro em dias normais;

2 - No segundo quadro com um feriado na terça-feira e segunda-feira subsequente;

3 - No terceiro quadro no feriado de Carnaval, em que a quarta-feira de cinzas, deve ser computada como dia útil, pois em regra a norma prevê o encerramento do expediente de forma antecipada e não seu início posterior;

4 - No quarto quadro abordamos o período de festas de final de ano, em que nas vésperas dos feriados os expedientes foram encerrados de forma antecipada (quarta-feira) e no dia subsequente (sexta-feira) foi decretado ponto facultativo. 

Não podemos confundir essa sistemática com a contagem de prazo penal brasileira, que  divide-se em direito material (prescrição, decadência, sursis, livramento condicional) e direito processual(prazo para a conclusão do inquérito policial, para oferecimento da denúncia pelo Ministério Público, para a conclusão da ação penal, para interposição de recursos, etc). 

O Código Penal Brasileiro em seu artigo 10 diz que: “Art. 10 - O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo. Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum.”  Esse é o prazo material , que começam sua contagem no mesmo dia em que os fatos ocorreram, independentemente de tratarem-se de dia útil ou feriado, encerrando-se também desse modo. Não se considera se são dias úteis ou não.  Ex: A prescrição do direito de promover a ação penal contra o autor do fato começa a contar no dia em que ocorreu o delito.

Já no direito processual penal a contagem é igual ao do Código de Processo Civil, se inicia no primeiro dia útil seguinte ao seu marco inicial e, caso se encerrem em feriados ou finais de semana, têm o final de sua contagem prorrogado para o primeiro dia útil subsequente.

Autores:  Maria de Lourdes Moreira                                         Wagner Pereira
               Bacharel em Direito                                                    Bacharel em Direito
               Pós-Graduando em Direito e Processo Penal           Pós-Graduado Direito Administrativo



4 comentários:

  1. Pergunta: O pedido de extração de cópias dos autos em que o servidor foi punido interrompe o prazo recursal?

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    1. O prazo recursal deve estar previsto em lei, portanto teremos a primeira classificação proposta no artigo, porém a pergunta nos remete a segunda classificação, em que este é dilatório ou peremptório, para tanto devemos ter conhecimento da legislação aplicável, acredito que o Senhor esteja se referindo as normas positivadas da Prefeitura do Município de São Paulo, portanto devemos nos ater ao parágrafo 3º do artigo 39 da Lei nº 14.141:

      Art. 39. O recurso não será conhecido quando interposto:
      I - fora do prazo;
      § 3º Salvo motivo de força maior devidamente comprovado, os prazos processuais não se suspendem.

      Portanto, trata-se de prazo dilatório pela a excepcionalidade prevista na norma, podemos também nos socorrer nos artigos 48 e 49 da Lei nº 13.530/03:

      Art. 48 - Decorrido o prazo, extingue-se para a parte, automaticamente, o direito de praticar o ato, salvo se esta provar que não o realizou por evento imprevisto, alheio à sua vontade ou a de seu procurador, hipótese em que o Presidente da Comissão Processante permitirá a prática do ato, assinalando prazo para tanto.

      Art. 49 - Não havendo disposição expressa nesta lei e nem assinalação de prazo pelo Presidente da Comissão Processante, o prazo para a prática dos atos no procedimento disciplinar, a cargo da parte, será de 48 (quarenta e oito) horas.

      Em nenhuma das duas hipóteses levantadas, podemos aplicar a suspensão tão somente pela existência de pedido de extração de cópias, pois no caso de sanções disciplinares promovidas no âmbito da Administração Direta da Prefeitura do Município de São Paulo, são precedidas por procedimento disciplinar de preparação e investigação, e neste caso apresentado, o exercício da pretensão punitiva foi realizado, portanto o interessado teve vários momentos processuais para requerer suas cópias.

      No entanto, na fase final dos procedimentos poderá ser vetada a vista processual e conseqüentemente o fornecimento de cópias, como previsto no artigo 166 da Lei nº 13.530/03:
      Art. 166 - O pedido de vista de autos em tramitação, por quem não seja parte ou defensor, dependerá de requerimento por escrito e será cabível para a defesa de direitos e esclarecimentos de situações de interesse pessoal.
      Parágrafo único - Poderá ser vedada a vista dos autos até a publicação da decisão final, inclusive para as partes e seus defensores, quando o processo se encontrar relatado.
      O mesmo pode ser aplicado a fase recursal, entretanto se atendo a pergunta, podemos crer que após a publicação do ato punitivo e se iniciando o prazo recursal, o pedido de extração de cópias não interrompe ou suspende este prazo, porém deve ser interposto pelo servidor ou seu procurador constituído de forma que permita ser apreciado e atendido de forma célere pela autoridade pública.

      Temos que nos ater, que a fase recursal nos procedimentos disciplinares da Prefeitura do Município de São Paulo é assegurada de forma obrigatória para a Administração Pública, porém facultativo a parte, que decide ou não pela sua interposição, pois esta teve a garantia dos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório durante o exercício da pretensão punitiva.

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  2. Um servidor público federal entrou com um pedido de remoção motivo saude de pessoa da famila. Uma remoção provisoria foi concedida pela administração. So que a Administração fixou que somente a remoção provisoria pode se efetivar definiva se passar dois anos da portaria da remoção provisoria, após avaliação médica da pessoa doente. Acontece que o servidor entrou com o pedido da primeira licença médica em junho de 2012, o pedido de remoção em outubro de 2012, a remoção saiu numa portaria de agosto de 2013. A administração considera agosto de 2013 como prazo inicial de 2 anos. Só que nao é abuso isso? Demorou muito o processo de remoção. E outra qual seria a melhor tese para se adequar ao prazo do pedido de remoção em outubro de 2012 ou a primeira licença médica em junho de 2012?

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  3. Pelo visto o pedido está previsto na legislação federal, logo terá todo um rito a ser seguido, da forma que você expõe o problema, ocorreu inércia da administração pública em apreciar o pedido, neste caso seria necessária uma análise dos fatos que incidiram na demora na concessão do pedido, acredito que você poderia formular um pedido administrativo solicitando que os efeitos da portaria retroagisse a data do pedido, caso pense na via judicial, terá que demonstrar que a inércia foi imotivada, por isso é importante que tenha uma decisão do pedido sugerido, para que a ação objetive efeitos retroativos.

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